terça-feira, 12 de outubro de 2010

A Viagem Do Elefante



D. João III ofereceu ao arquiduque da Áustria, seu primo Maximiliano II, um elefante asiático oriundo da Índia. Estava-se em pleno século XVI e o paquiderme empreendeu uma viagem que do Oriente o trouxe a Lisboa e de Lisboa o levou a Viena. Ou seja, empreendeu um percurso que “é uma metáfora da vida humana” nas palavras de José Saramago a propósito do seu mais recente livro “ Viagem do Elefante”.
O livro, com mais de 250 páginas, não é contudo, segundo o Prémio Nobel da Literatura português, um romance, mas sim um conto. E isto porque, como referiu em recente entrevista à agência Lusa, “lhe falta uma história de amor – o elefante não conhece uma elefanta no caminho – e conflitos, crises”.
Tão pouco José Saramago procurou a verdade histórica da viagem empreendida pelo paquiderme; “os dados históricos eram pouquíssimos e o que há tem que ver principalmente já com o que se passou depois da chegada do elefante à Áustria. De Lisboa até lá, não se sabe o que aconteceu. Sabe-se, ou parte-se do princípio de que foi de Lisboa até Valladolid – onde o arquiduque era, desde há dois ou três anos, regente – que embarcou no porto da Catalunha para Génova e que tudo o que não foi esta pequena viagem de barco foi, como costumamos dizer, à pata”, disse Saramago.
O escritor teve conhecimento da história, “há uns anos, já bastantes”, em Salzburgo, de uma forma curiosa que contou na primeira pessoa. “Creio que no próprio dia da minha chegada [a Salzburgo] fomos jantar a um restaurante que se chamava 'O Elefante'. O simples nome do restaurante não era suficiente para despertar a minha curiosidade, mas a verdade é que lá dentro havia uma escultura relativamente grande representando um elefante e havia, sobretudo, um friso de pequenas esculturas que, entre a Torre de Belém, que era a primeira, e outra de um monumento ou edifício público que representaria Viena, marcava o itinerário do elefante entre Lisboa e Viena. Perguntei o que era e nesse momento senti que poderia dar uma história”.
José Saramago iniciou a escrita do livro em Fevereiro de 2007, mas foi forçado a interrompê-la por motivos de saúde, terminando assim a sua nova obra, em Agosto deste ano, mais precisamente no dia 12. Quanto ao conto, diz o autor que a entende como “uma metáfora da vida humana: este elefante que teve de andar milhares de quilómetros para chegar de Lisboa a Viena, morreu um ano depois da chegada e, além de o terem esfolado, cortaram-lhe as patas dianteiras e com elas fizeram recipientes para pôr os guarda-chuvas, as bengalas, essas coisas. [...] Quando uma pessoa se põe a pensar no destino do elefanto – que depois de tudo aquilo, acaba de uma maneira quase humilhante, aquelas patas que o sustentaram durante milhares de quilómetros são transformadas em objectos, ainda por cima de mau gosto – no fundo, é a vida de todos nós. Nós acabamos, morremos em circunstâncias que são diferentes umas das outras, mas no fundo tudo se resume a isso”.

http://www.vozoperario.pt/cultura/136-cultura/149-a-viagem-do-elefante.html

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