sábado, 4 de junho de 2011

Como pássaros feridos

Como pássaros feridos vogamos
Entre os destroços dum mundo de temporais,
Somos restos apanhados nos escolhos
Da maré de mares imemoriais.
Somos capitães de navios sem vela nem proa,
Sonâmbulos galgando precipícios,
Mordemos nos nossos corpos desmembrados
Os nervos cravados nos nossos vícios.
Somos o creme dos cafés cheirando a azeite,
A nata do leite derramado,
Azedamos pensamentos em tempo estreito
Dos papéis de mortalha sem tabaco.
Somos feitores de quintas-feiras sem manhãs,
Submersos em abraços fraternais,
Poetas de ceroulas sem retratos,
Convidados de ceias sem cardeais.
Somos como pássaros enlouquecidos,
A cada descoberta da alvorada,
Escondendo-nos de olhos e ouvidos
Para que não se acabe a noite engalanada.
E na janela indiscreta dos poemas
Que escrevemos sem o pudor de verdes anos,
Voamos sobre ninhos de cucos normalizados,
Pássaros, poetas, loucos, mas nunca castrados.


Noélia Santa Rosa

http://noelsantarosa.blogspot.com/

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